Fábio Henriques: gravação e mixagem sem mistérios. Parte 2 / Conceitos

//Fábio Henriques: gravação e mixagem sem mistérios. Parte 2 / Conceitos

Fábio Henriques: gravação e mixagem sem mistérios. Parte 2 / Conceitos

Em complemento ao post anterior, no qual bati um longo papo sobre gravação, mixagem e acústica em homestúdios com Fábio Henriques, engenheiro de som e autor dos Guia de Mixagem vol. 1 e Guia de Mixagem vol.2, segue abaixo o segundo trecho da entrevista. Nela, o produtor fala sobre mixagem, masterização, simuladores de amplificador, além de dar toques importantes sobre como conseguir um padrão mínimo de acústica em estúdios caseiros. Para saber mais sobre o assunto, acesse a primeira parte Gravação e mixagem sem mistérios. Parte 1 / Pré-produção. Com a palavra, Fábio Henriques. 

Quais são as dicas essenciais para fazer uma mixagem com qualidade?
Fábio Henriques: Formação. Ouvir um trilhão de músicas com espírito crítico e desenvolver um conceito próprio. Depois, experimentar muito e procurar a maior quantidade de informação técnica. Nos livros Guia de Mixagem 1 e Guia de Mixagem 2 cito alguns mandamentos indispensáveis.

1) Conheça a técnica: não dá para tentar conseguir timbrar os instrumentos se você não sabe usar um equalizador, ou compressor, por exemplo.

2) Conheça a arte: ouvir música com espírito crítico, comparar estilos, tendências, informar-se sobre o que está acontecendo.

3) Conheça o cliente: que no caso é você mesmo. O que você pretende? Quais suas características artísticas? Como é o seu som?

Não é raro aparecer para mim um cara que se autodenomina produtor pop, mas que nunca ouviu The Police, ou Queen. Aí fica difícil. 

É possível masterizar em casa com qualidade?
Fábio Henriques: Francamente falando, não. O que não quer dizer que não se deve tentar. E por que digo isso? A masterização não visa somente dar à música a malfadada "pressão". O que se pretende é obter um som que soe bem na maioria dos lugares onde ela será ouvida. E isso só dá para conseguir (sem fazer uso da sorte, ou acaso) com uma sala de alta qualidade e um equipamento de ponta. Imagina se a gente masteriza em casa com nossa placa que tem um ruído de fundo de -48dB, e alguém toca o nosso Cd em um som a todo volume?

Agora, se estamos falando do mundo real, a maioria não tem condições de bancar uma supermasterização. Então, se não temos alternativa, devemos tomar cuidado com o seguinte. Se até agora a sua mixagem está soando bem, como você acha que uma masterização a tornará melhor? Seus ouvidos são os mesmos! Tem gente que se acha obrigado a puxar "ar" e aumentar os "graves" para ficar com um sonzão, mas não é por aí. O que se pretende é basicamente (caso você esteja feliz com a sua sonoridade, claro) obter mais volume aparente sem aumentar o volume máximo. Existem algumas ferramentas que permitem isso com alguma facilidade, como o Ozone (acima, à direita), e as ferramentas da PSP, por exemplo, mas devemos resistir à tentação de ficar puxando agudos e graves e de supercomprimir. Meu conselho é: trabalhe sua mix até que esteja feliz com ela. Se for obrigado a masterizar, preocupe-se em ganhar volume sem descaracterizar o que fez até então

Você citou a questão do ruído de fundo. Qual é a importância de se ter um bom tratamento acústico em um homestudio?
Fábio Henriques: O tratamento acústico é importante em todo estúdio. Mas o tratamento que dá pra fazer em um homestudio é limitado. Embora não seja a pessoa mais gabaritada para falar sobre este assunto, se eu fosse montar um estúdio caseiro, já que não tenho orçamento para tratar o som, eu me preocuparia em amortecê-lo. Ou seja, acho melhor um ambiente sem ambiência do que com excesso. Outro dia, um amigo me perguntou exatamente o que deveria fazer para controlar a acústica sem investir em tratamento. Sendo assim, recomendei: se o homestudio estiver localizado em seu quarto, deixe as portas do armário abertas, coloque uma cortina pesada na janela, um tapete grosso e, se a mãe ou esposa não se importarem, pregue um edredom na parede. Ficou bonito? Pelo contrário, mas ele se livrou das estacionárias.

Quais seriam os cuidados mínimos relativos à acústica de um homestudio?
Fábio Henriques: Evitar as estacionárias. Elas são ondas na região dos graves, e dependem da geometria da sala. Recomendo uma boa lida no Manual Prático de Acústica, do Sólon do Valle (leia também a entrevista com o especialista, publicada aqui no blog). 

Percebemos hoje uma avalanche de plug-ins que simulam amplificadores de guitarra e baixo. Em sua opinião, corremos o risco de cair em uma espécie de padronização, ou mesmice sonora? Como obter uma sonoridade original?
Fábio Henriques: É claro que sim. É como nos timbres de teclado. Quem tem mais de 30 anos ainda deve se lembrar do som de piano elétrico DX7, da Yamaha, ou do violão Ovation com Chorus que todo mundo usava na década de 80. É um perigo a facilidade técnica. Tem gente que odeia o POD, da Line 6 (à direita), por exemplo, mas eu tenho obtido muito bons resultados com ele. Só que a gente tem que ralar muito pra conseguir um timbre autêntico e individual. Para conseguir bons resultados, temos que primeiro ler o manual! Depois, colocar as mãos e os ouvidos para trabalhar, sem sair rodando botões irresponsavelmente. É muito bacana quando se consegue um timbrão por acaso, mas tente conseguir de novo pra ver o que é bom.

Já que você citou o POD, em sua opinião, o que é melhor na hora de gravar guitarra ou baixo: utilizar simuladores de amplificador, ou microfonar, de forma tradicional, esses instrumentos?
Fábio Henriques: Quem tem um superamplificador em excelente estado e ótimos microfones? Quem tiver que os use. Os seres humanos normais podem se dedicar a obter excelentes resultados com os bons simuladores que existem à disposição no mercado.

Citando também os plugins de bateria, que podem ser utilizados com kits de pads, pela sua experiência, esta seria uma alternativa para os que não possuem um tratamento acústico ideal para gravar instrumentos percussivos?
Fábio Henriques: Sim, se forem usados nos trabalho que os exijam. Frequentemente, recebo baterias em que o bumbo é de um kit, a caixa de outro e os tambores de outro, cada um configurado em uma sala diferente e com graus distintos de vazamento. Um caos! Certa vez, quando um cliente me trouxe uma sessão de gravação em que o bumbo tinha sido gravado em cinco canais – os microfones foram posicionados um dentro do bumbo, outro fora, dois captando o ambiente e outro um pouco mais de longe – , ele adorou o resultado que obtive com este material. O que fiz foi justamente deixar só o primeiro sinal de áudio captado pelo microfone de dentro do bumbo, e apagando os outros quatro.

Aliás, em uma mixagem, o mais importante no início do trabalho é decidir, sem romantismo, o que deve ser desligado. Como diz Ron Streicher, "Quer gravar uma orquestra? Dê-me dois microfones e teremos o bastante. Dê-me mais de dois microfones e nunca teremos o bastante". Para quem tem interesse no assunto, no segundo volume do Guia de Mixagem há uma discussão interessante sobre a sonoridade da bateria em uma mixagem moderna.

Podemos esperar algum livro novo de sua autoria? Se sim, poderia adiantar um pouco do que se trata?
Fábio Henriques: Sem dúvida. Neste momento, estou escrevendo o Guia de Mixagem Vol. 3 – Mixagem de Gravações ao Vivo em Estéreo e Surround. Logo a seguir, teremos o Guia de Mixagem vol. 0 – Os equipamentos (o que saber antes de começar), e mais para o futuro o Guia de Microfonação. Quem tiver sugestões de outros temas, por favor, é só acessar o meu site e me enviar (www.fabiohenriques.com.br).

2009-09-01T22:45:05+00:00 setembro 1st, 2009|Categories: entrevistas|

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